As férias de Freud em Lavarone

Lavarone, uma pequena localidade situada num planalto dos Dolomitas, não muito longe da cidade de Trento, foi descoberta por Freud, no verão de 1900, quando, rumo ao sul de Itália, na companhia da cunhada, aí passou uns dias. E diz- se logo agradado, “com o lago, o pinhal, o sossego, os passeios, o acolhimento e a comida” numa carta enviada à mulher Martha durante essa sua primeira estadia.  Aí passou longas férias, no então recém- construído e agora famoso Hotel du Lac, com a família, nos verões de 1906 e 1907.  Foi aí que escreveu o ensaio sobre a Gradiva de Jensen.  Foi igualmente em  Lavarone que Freud se refugiou, em Agosto do terrível verão de 1923, depois da morte do adorado neto Heinele, convalescente das duas primeiras intervenções cirúrgicas. Com Freud estavam, além da mulher e da filha Ana, o neto Ernst,  irmão mais velho de Heinele, e o seu médico pessoal, o Dr. Deutsch. No final de Julho reuniu-se com o seu “comitê ” de sempre, ou seja, com Jones, Ferenczi, Ettington, Abraham, Sachs e Rank, que foram até Lavarone  para o apoiar e com ele trabalhar.

Freud nunca mais voltaria a Lavarone, contudo, o seu nome continua a ser recordado na avenida que bordeja o lago, na biblioteca municipal Sigmund Freud, inaugurada em 1970, e  numa lápide aposta no Hotel du Lac. Além disso, ciente do impacto cultural promovido pela ligação de Freud ao seu território, a autarquia  de Lavarone, em parceria com a universidade de Pádua, criou um centro cultural denominado “Centro de Estudos de Psicanálise Aplicada Gradiva”  que promove, desde 1990, conjuntamente com a Sociedade Italiana de Psicanálise, um congresso anual, multi- disciplinar, com inscrição gratuita e aberto ao público em geral, com a finalidade de debater temas de interesse comuns á psicanálise e a outras aéreas do saber.

No passado mês de Julho, tive a oportunidade de assistir à edição do congresso deste ano, subordinado  ao tema “Fronteiras da Psicanálise”. Os participantes, todos italianos, foram numerosos e provenientes de várias disciplinas, tendo sido um psicanalista, o nosso bem conhecido Stefano Bolognini,  que abriu o congresso com um interessantíssimo trabalho intitulado “A evolução da  psicanálise e as suas complexas relações com outras aéreas da cultura contemporânea”. As  “fronteiras” sucessivamente abordadas foram a moral e a bioetica, a literatura, a sociologia e o cinema, tudo rematado por uma extensa discussão com um público heterogéneo e muito participativo.

Quanto aos temas abordados em congressos anteriores escolho mencionar, a título de curiosidade:  “A escuta psicanalitica e o ouvido musical”, ” As novas famílias “, ” As forças obscuras do poder”, “A experiência da beleza” ou ainda “A viagem: itinerários entre mundo externo e mundo interno” e ” A mente que escreve: psicanálise, literatura, poesia”.

No termo do congresso procedeu- se à apresentação do volume extraordinário da revista ” Psicanálise e Psicoterapia Psicoanalitica “, (Franco Angeli, 2017) intitulado “A arte e a psicanálise: o sopro da criatividade”, que acolhe, entre outros, artigos de  Simona Argentieri, Stefano Bolognini e Rita Manfredi.

Imagem: Hotel du Lac, Lavarone

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