Pensar em crescimento conduz a imaginar um caminho desafiante. Caminho que é construído nas relações que se estabelecem com as pessoas e objectos no mundo externo, de forma sentida e simbolizada, com possibilidade de integrar estas relações num mundo interno próprio e individual.
Um dos primeiros desafios ocorre no momento do nascimento do ser humano. O recém-nascido, no desafio de se expor a um novo mundo, pode sentir-se gratificado por ser recebido e acolhido nesta nova realidade, a Mãe. Inicia, assim, um caminho onde lhe seja possível sentir e desejar criar relações externas, envolvidas por emoções e afectos. Neste caminho, a vida interna move-se, dinamiza-se, e cresce o desejo de conhecer o que está para lá de mim, do Eu; para lá do outro, da Mãe; para lá de si, dos outros.
Cresce-se, porque é dada a possibilidade de se sentir o que se vai aprendendo e o que se vai conhecendo; simbolizando e interiorizando o que se aprende no mundo onde nos relacionamos, onde nos espelhamos, onde nos projectamos e identificamos.
Com a Psicanálise e através da possibilidade de estabelecer uma relação num setting analítico único, numa relação intersubjectiva entre analista e analisando, promove-se o crescimento do ser humano, na pessoa do analisando e também na pessoa do analista. Um novo desafio, e atendendo a esta relação única, é colocado no tempo de crescimento do ser humano, um tempo próprio e do próprio, que não obedece a um tempo externo. Um tempo vivido na díade analítica, onde o analista acolhe e elabora o que o analisando narra livremente, o que vive e o que viveu, o que associa, o que simboliza, o que sente, o que pensa, possibilitando um tempo transformador, promotor do crescimento pessoal.
Nos dias de hoje, assistimos a um outro desafio muitas vezes designado por «falta de tempo»!
A pressa de viver «para lá chegar», muitas vezes não se sabendo bem aonde, desafia- nos e questiona-nos sobre a forma como se faz este caminho de crescimento, sem se ultrapassarem as etapas do desenvolvimento psicológico e do desenvolvimento pessoal, subjectivo e interno, necessárias à conquista da autonomia e da individualidade do ser humano.
Cresce-se com pressa, em relações humanas muitas vezes vividas na «falta de tempo», com a necessidade de se responder rápido, correndo-se o risco de se comprometer a capacidade de pensar e de elaborar sobre o que se está a sentir e a viver.
Somos, então, desafiados a pensar nos riscos que se correm, nomeadamente nos riscos de serem criados vazios e faltas internas, ou de ser criada uma incapacidade de pensar nos obstáculos ao crescimento, sem o Tempo que permita a sua transformação e interiorização.
A Psicanálise e a relação vivida no par analítico permitem recuperar esse Tempo, tornando consciente o inconsciente ainda não elaborado, possibilitando, desta forma, crescer na construção identitária e na conquista de uma autonomia emocional e uma liberdade interna própria. Caminha-se, assim, através de um processo de amadurecimento psíquico com a capacidade de sustentar e elaborar os conflitos internos necessários ao crescimento pessoal e subjectivo.
Nos dias de hoje, o tempo é também vivido com excesso de estímulos, valorizando-se a produtividade e a competitividade e podendo comprometer o crescimento pessoal.
O implantar do mundo digital e as novidades da inteligência artificial, se nos podem simplificar nos «afazeres» do dia-a-dia, não deixam de ser um desafio quando pensamos no crescimento humano. Os likes ou reconhecimento imediato não substituem e até podem enviesar a qualidade afectiva das relações humanas tão necessárias ao crescimento. O espelho do outro não será o espelho do ecrã ou do chat, onde não há espaço para as emoções, para projectar e reflectir afectos. Compromete-se a organização do narcisismo e de um self autêntico quando se vive neste mundo de hipervigilância.
Crescer não é apenas sinal de sucesso externo; crescer é, sobretudo, conseguir desenvolver a capacidade para gerir as fragilidades e desejos internos.
Valorizar o crescimento enquanto experiência subjectiva, onde cada pessoa pode encontrar o seu tempo próprio e o seu sentido de vida, este, sim, é um novo desafio para os dias de hoje.
Fotografia: João Santana Lopes